sexta-feira, 23 de julho de 2010

PAIDEIA

Texto elaborado por membro do do grupo RODA FILOSOFAL, coordenado pelo Professor Ives Gandra Martins Filho.

Paideia (português europeu) ou Paidéia (português brasileiro): Paideia), segundo Werner Jaeger, era o "processo de educação em sua forma verdadeira, a forma natural e genuinamente humana" na Grécia antiga.
Histórico
Inicialmente, a palavra paidéia (de paidos - criança) significava simplesmente "criação de meninos". Mas, como veremos, este significado inicial da palavra está muito longe do elevado sentido que mais tarde adquiriu.
O termo também significa a própria cultura construída a partir da educação. Era o ideal que os gregos cultivavam do mundo, para si e para sua juventude. Uma vez que o governo próprio era muito valorizado pelos gregos, a Paidéia combinava ethos (hábitos) que o fizessem ser digno e bom tanto como governado quanto como governante. O objetivo não era ensinar ofícios, mas sim treinar a liberdade e nobreza. Paidéia também pode ser encarada como o legado deixado de uma geração para outra na sociedade.
Um pedagogo - um escravo, na época - conduzia o jovem, com sua lanterna ilumina(dor)a, até aos centros ou assembléias, onde ocorriam as discussões que envolviam pensamentos críticos, criativos, resgates de cultura, valorização da experiência dos anciãos etc.
Supõe-se que, no processo sócio-histórico, esse mesmo pedagogo libertou-se, talvez de tanto dialogar nos acompanhamentos do jovem até as assembléias, tornando-se um personagem da paidéia, e seu consuma(dor).
Mas, se até então o objectivo fundamental da educação era a formação aristocrática do homem individual como Kalos agathos ("Belo e Bom"), a partir do século V a.C., exige-se algo mais da educação. Para além de formar o homem, a educação deve ainda formar o cidadão. A antiga educação, baseada na ginástica, na música e na gramática deixa de ser suficiente.
É então que o ideal educativo grego aparece como paidéia, formação geral que tem por tarefa construir o homem como homem e como cidadão. Platão define paidéia da seguinte forma "(...) a essência de toda a verdadeira educação ou paidéia é a que dá ao homem o desejo e a ânsia de se tornar um cidadão perfeito e o ensina a mandar e a obedecer, tendo a justiça como fundamento" (cit. in Jaeger, 1995: 147)
Do significado original da palavra paidéia como criação de meninos, o conceito alarga-se para, no século IV a.C., adquirir a forma cristalizada e definitiva com que foi consagrado como ideal educativo da Grécia clássica.
Como diz Jaeger (1995), os gregos deram o nome de paidéia a "todas as formas e criações espirituais e ao tesouro completo da sua tradição, tal como nós o designamos por Bildung ou pela palavra latina, cultura." Daí que, para traduzir o termo paidéia "não se possa evitar o emprego de expressões modernas como civilização, tradição, literatura, ou educação; nenhuma delas coincidindo, porém, com o que os gregos entendiam por paidéia. Cada um daqueles termos se limita a exprimir um aspecto daquele conceito global. Para abranger o campo total do conceito grego, teríamos de empregá-los todos de uma só vez." (Jaeger, 1995: 1).
Na sua abrangência, o conceito de paideia não designa unicamente a técnica própria para, desde cedo, preparar a criança para a vida adulta. A ampliação do conceito fez com que ele passasse também a designar o resultado do processo educativo que se prolonga por toda vida, muito para além dos anos escolares.
A paidéia, vem por isso a significar "cultura entendida no sentido perfectivo que a palavra tem hoje entre nós: o estado de um espírito plenamente desenvolvido, tendo desabrochado todas as suas virtualidades, o do homem tornado verdadeiramente homem" (Marrou, 1966: 158).

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
Antiguidade grega: a paidéia
Pedagogia


O que é a Paidéia

(...) as explicações predominantemente religiosas são substituídas pelo uso da razão autônoma, da inteligência crítica e pela atuação da personalidade livre, capaz de estabelecer uma lei humana e não mais divina. Surge a necessidade de elaborar teoricamente o ideal da formação, não do herói, submetido ao destino, mas do cidadão.

O cidadão = não será mais o depositário do saber da comunidade, mas aquele que elabora a cultura da cidade. Não está preso ao passado, mas é capaz de projetar o futuro.

O termo Paidéia:

+ Foi criado por volta do século V a.C.

+ Inicialmente significava apenas: criação dos meninos (pais, paidós, “criança”).

A Paiagogos significa:
Grécia clássica pode ser considerada o berço da pedagogia. literalmente aquele que conduz a criança (agogôs, “que conduz”): o escravo que conduz a criança à escola.

O termo pedagogia se amplia, adquirindo o sentido de teoria sobre a educação.

Os gregos, ao discutir os fins da Paidéia, esboçam as primeiras linhas conscientes da ação pedagógica.


Tradição mítica


+ A concepção mítica na Grécia predomina até o século VI a.C.
+ Os mitos gregos recebiam forma poética e eram transmitidos oralmente, em praça pública, pelos cantores ambulantes (aedos e rapsodos).

+ Alguns mitos (Ilíada e Odisséia) são atribuídos a Homero.
+ Nos relatos míticos das epopéias de Homero:

- O herói vive na dependência dos deuses e do destino (falta-lhe a noção de livre arbítrio);
- Ter sido escolhido pelos deuses é sinal de valor e em nada desmerece sua virtude.
- A noção de virtude (areté) não se confunde com o conceito moral de virtude conforme o conhecemos depois, mas significa força, excelência e superioridade, alvo supremo do herói.

Nasce a filosofia
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Passagem do+ Filosofia: milagre grego? pensamento mítico para o racional e filosófico.
+ O surgimento da filosofia na Grécia não é um salto realizado por um povo privilegiado, mas a culminância de um processo que se fez ao longo de milênios e para a qual concorreram as novidades introduzidas na época arcaica.
Essas+ Novidades: escrita, moeda, lei e polis. transformações foram responsáveis por uma nova visão que o homem passa a ter do mundo e de si próprio.
+ A escrita:
- Proporciona a possibilidade de maior abstração, que tende a modificar a estrutura do pensamento ao propiciar o distanciamento do vivido, o confronto das idéias, a retomada do relato escrito.
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- Surge como exigência de rigor e clareza, estimulando o espírito crítico.
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+ A lei escrita:
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- A justiça, antes submetida à arbitrariedade dos reis ou da interpretação da vontade divina, volta-se para a discussão, Fundamento para a democracia nascente.adquirindo um caráter humano.
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+ A polis:
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- Está centralizada na ágora (praça pública), onde se discutem os problemas de interesse comum;
- Constitui-se com a autonomia da palavra (da argumentação)
(...) A expressão da individualidade por meio do debate engendra a política, libertando o homem dos desígnios divinos, para que ele próprio possa tecer seu destino na praça pública. (42).
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Educação
A formação integral
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+ A educação grega era centrada na formação integral Apesar, conforme a época, fosse enfatizado o preparo(corpo e espírito) esportivo ou intelectual.
+ Quando não existia a escrita, a educação era ministrada pela própria família, conforme a tradição religiosa.

+ Com o aparecimento da aristocracia dos senhores de terras, de formação guerreira, os jovens da elite eram confiados aos preceptores.
+ As escolas apareceram com o advento das polis. No período clássico, sobretudo em Atenas, a instituição escolar já se encontrava estabelecida.
+ A escola ainda permanecia elitizada, atendendo aos jovens de famílias tradicionais da antiga nobreza ou dos comerciantes enriquecidos.

(...) na sociedade escravista grega, o ócio digno significa a disponibilidade de gozar do tempo livre, privilégio daqueles que não precisam se preocupar com a própria subsistência. Não por acaso, a palavra grega para escola (scholé) significa inicialmente “o lugar do ócio”. (p.50).


antes predominantemente guerreira/militar,+ Educação física - passa a se orientar, sobretudo para os esportes.

+ Nas escolas de formação mais esportiva que intelectual, o ensino das letras e cálculos demora um pouco mais para se difundir.

+ A inversão da formação física para a espiritual se dará com o ensino superior ministrado pelos filósofos

+ A transmissão da cultura grega se dá além das famílias e das escolas, nas inúmeras atividades coletivas (festivais, banquetes, reuniões na ágora).






Homero, educador da Grécia



+ A educação na época da aristocracia guerreira visava a formação cortês do nobre. (Influência das epopéias de Homero que relatam as ações dos deuses e transmitem os costumes, a língua, os valores éticos e estéticos).

+ O guerreiro era formado para a virtude: sentido de força e coragem, atributos do guerreiro “belo e bom”, aos quais se acrescentam a prudência, a lealdade, a hospitalidade, a honra, a glória e o desafio à morte.

+ A criança nobre permanecia em casa até os sete anos, quando era enviada aos palácios de outros nobres a fim de aprender, como escudeiro, o ideal cavalheiresco.
+ Eram contratados preceptores que davam uma formação integral baseada no afeto e no exemplo.

+ No período arcaico e na época clássica, continuou a prevalecer a influência cultural das epopéias na educação.


Educação espartana



+ Após a fase homérica, ao contrário das demais cidades gregas, continua a valorizar as atividades guerreiras e a desenvolver uma educação severa, voltada para a formação militar.
O+ Século IX a.C. legislador Licurgo organizou o Estado e a educação: de início, os costumes não eram tão rudes e o preparo militar era intercalado com a formação esportiva e musical; depois, quando Esparta derrotou Atenas, o rigor da educação passou a se assemelhar à vida de quartel.

+ Cuidados com o corpo começaram com uma prática de melhoramento da espécie: recomendação depolítica de eugenia abandonar as crianças deficientes ou frágeis demais e procurar fortalecer as mulheres para gerarem filhos robustos e sadios.

+ As crianças:
- Permaneciam com a família até os sete anos, quando o Estado passava a oferecer uma educação pública e obrigatória.
- Viviam em comunidades constituídas por grupos que se formavam de acordo com a idade, supervisionados pelos que se distinguiam no desempenho das tarefas exigidas.

+ Como todos os gregos, os espartanos desenvolveram o estudo de música, canto e dança coletiva.
+ Até os 12 anos predominavam as atividades lúdicas, aumentando gradativamente o rigor da aprendizagem e transformando a educação física em verdadeiro treino militar.
+ Os jovens aprendiam a suportar a fome, o frio, a dormir com desconforto, a vestir-se de forma despojada.
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+ A educação moral valorizava a obediência, a aceitação dos castigos, o respeito aos mais velhos e privilegiava a vida comunitária.
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+ Ao contrário dos atenienses, os espartanos não eram educados para os refinamentos intelectuais, nem apreciavam os debates e os discursos longos.
+ Esparta oferecia às mulheres maior atenção em relação às demais cidades gregas. Estas participavam das atividades físicas e exibiam nos jogos públicos toda a força, a beleza e o vigor dos corpos bem treinados.
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Educação ateniense
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+ Ao lado dos cuidados com a educação física, destacava-se a formação intelectual, para que melhor se pudesse participar dos destinos da cidade.

+ Final do O Estado demonstrava apareceram formas simples de escolas. século VI a.C. algum interesse a respeito, mas o ensino não se tornara obrigatório nem gratuito.
+ A educação se iniciava aos sete anos. As meninas permaneciam no gineceu (parte da casa onde as mulheres se dedicavam aos afazeres domésticos). Os meninos desligavam-se da autoridade materna e eram iniciados na alfabetização, na educação física e musical.
+ Acompanhado por um escravo (o pedagogo), o menino dirigia-se à palestra, onde praticava exercícios físicos. Sob a orientação do pedótriba (instrutor físico), era iniciado em corrida, salto, lançamento de disco, de dardo e em luta (cinco modalidades do pentato) A educação física não se reduzia à mera destreza corporal, mas vinha acompanhada pela orientação moral e estética.

+ A educação musical também era valorizada o pedagogo levava a criança ao citarista (professor de cítara). Cultivava-se também o canto coral, a declamação de poesias, geralmente acompanhada por instrumentos musicais.


A preocupação com a formação integral se expressa na frase de Platão: “Eles [os mestres de música] familiarizaram as almas dos meninos com o ritmo e a harmonia, de modo que possam crescer na gentileza, em graça e harmonia, e tornarem-se úteis em palavras e ações”. (p.52)


+ O ensino elementar de leitura e escrita, durante muito tempo, recebia menor atenção e cuidado do que as práticas esportivas e musicais. O mestre era geralmente uma pessoa humilde, mal paga e sem o prestígio do instrutor físico.

+ Á medida que aumentava a exigência de melhor formação intelectual, delineavam-se três níveis de educação: elementar, secundária e superior.

+ O gramático (grammata = letra) costumava reunir em qualquer lugar um grupo de alunos, para ensinar-lhes leitura e escrita. Usava métodos que dificultavam a aprendizagem, em que era acentuado o recurso da silabação, repetição, memorização e declamação.
+ Nessas escolas as crianças escreviam em tabuinhas enceradas e faziam os cálculos com o auxílio dos dedos e do ábaco.

+ A educação elementar completava-se por volta dos 13 anos. As crianças mais pobres saíam em busca de um ofício, as de família rica continuavam os estudos, sendo encaminhas ao ginásio.

+ Dos 16 aos 18 anos, a educação adquiria uma dimensão cívica de preparação militar.
+ Apenas com os sofistas se iniciou uma espécie de educação superior.
+ Sócrates, Platão e Aristóteles ministraram na educação superior. Sócrates se reunia informalmente na praça pública, Platão utilizava um dos ginásios de Atenas (a Academia), Aristóteles ensinava em outro ginásio (o Liceu).

+ Não há uma preocupação com o ensino profissional, pois os ofícios deveriam ser aprendidos no próprio mundo do trabalho. Uma exceção é a medicina, profissão altamente considerada entre os gregos.


Educação no período helenístico

+ Helenismo – fusão da cultura helênica às civilizações que a dominam.
+ A antiga Paidéia torna-se enciclopédia (educação geral) = ampla gama de conhecimentos exigidos para a formação do homem culto.
+ Cada vez mais aumentavam os estudos teóricos, restringindo-se o tempo dedicado aos exercícios físicos.

+ Nos grupos superiores predominava o saber erudito e distanciado do cotidiano. As questões metafísicas e políticas forma substituídas pelos temas éticos.
+ Ao lado do ensino elementar, orientado pelo gramático, desenvolveu-se o nível secundário, sendo ampliada a função de retor (mestre de retórica).
+ O conteúdo abrangente do programa foi cada vez mais caracterizado pelas sete artes liberais: disciplinas humanísticas (gramática, retórica e dialética) e científicas (aritmética, música, geometria e astronomia).

+ Inúmeras escolas filosóficas se espalharam, e da junção de algumas foi constituída a Universidade de Atenas, centro de fermentação intelectual que perdurou até o período da dominação romana.

+ 331 a.C. Alexandre Magno faz de Alexandria, outro local importante de estudos superiores.

Conclusões
+ O ideal grego de educação sofreu significativas alterações.
+ Por pertencer a uma sociedade escravista, os gregos desvalorizavam a formação profissional e o trabalho manual. Enquanto a técnica se achava associada à prática dos escravos, o cultivo desinteressado da forma física e a atividade intelectual permaneciam privilégios das classes ociosas.

+ A Grécia é o berço das primeiras teorias educacionais, fecundadas pelo embate de tendências pluralistas.


BIBLIOGRAFIA
ARANHA, Maria Lúcia. História da Educação. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Moderna, 1996.

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